Vendemmia Newsletter | Janeiro de 2023

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A MP nº 1.152/22 e as novas regras de preços de transferência no Brasil: como proceder daqui para frente?

No final do ano passado, buscando alinhamento das normas brasileiras às diretrizes do padrão estabelecido nas Transfer Pricing Guidelines da OCDE-Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, foi publicada a Medida Provisória nº 1.152 (MP nº 1.152/22) que alterou a legislação do IRPJ-Imposto sobre a Renda das Pessoa Jurídicas e da CSLL-Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e, assim, promoveu alterações relevantes na sistemática de preços de transferência no Brasil.

O preço de transferência consiste na tributação de operações internacionais de venda de mercadorias ou produtos entre empresas vinculadas (i.e., empresas de um mesmo grupo econômico). Um dos seus objetivos principais é evitar a redução indevida das bases de cálculo através da fixação de preços artificiais em operações entre partes ligadas – controladas ou coligadas- como, por exemplo, o que pode ser observado na transferência indireta de lucros em empresas estabelecidas em países com tributação favorecida.

No mais pontua-se, inclusive, que “é necessária máxima atenção para o conceito adotado pela Receita Federal de `controladas e/ou coligadas`, pois tal conceito possui ampla extensão e abarca todas as empresas que possuem algum tipo de interdependência, econômico-financeira e também societária” – alerta o Diretor Jurídico da Vendemmia, André Riva.

Assim, em termos gerais, a MP nº 1.152/22 acaba com o modelo de preço de transferência com base em margens fixas, adotado pelo Brasil desde 1996, bem como deverá acabar com situações de dupla tributação ou dupla não-tributação em operações envolvendo empresas ligadas que estejam localizadas em países distintos.

Infere-se, pois, que as novas regras impõem limites para a dedução, no país importador, de custos e despesas, bem como estabelecem uma margem mínima de lucros a serem tributados no país exportador. O intuito é que seja possível chegar ao mesmo valor que a operação teria caso fosse praticada entre empresas não relacionadas/independentes, através do comparativo com operações semelhantes praticadas por partes não vinculadas. No mais, a MP também altera o conceito de país com tributação favorecida para “país que não tribute a renda ou que a tribute a alíquota máxima inferior a 17% (dezessete por cento).

Contudo, uma vez que o modelo abarcado pela MP é utilizado internacionalmente e pareça refletir mais da realidade comercial atual, a nova sistemática se apresenta mais complexa do que a atual e conta com um alto grau de subjetividade às empresas que transacionam com partes relacionadas no exterior, podendo, por consequência, vir a gerar maior custo de compliance às mesmas. Não por outra razão, muito tem se discutido nesse sentido: sobre como proceder daqui para frente, quais alterações foram realizadas, quais disposições foram introduzidas, ou seja, vários questionamentos a fim de proporcionar maior segurança jurídica aos contribuintes ante a praticabilidade tributária do fisco federal.

Dessa forma buscamos trazer, de forma mais simplificada, as principais alterações e disposições gerais tratadas pela MP nº 1152/22. Confira a seguir:

1. Arm’s Length

A MP 1152/22, em seu art. 2º, adota de forma ampla o princípio do arm’s length em todas as operações sujeitas ao controle de preços de transferência como determinante da base de cálculo dos tributos de que trata as operações sujeitas às normas de preço de transferência. De acordo com referido princípio, os termos e as condições de uma transação controlada serão estabelecidos com base naqueles que seriam estabelecidos em transações comparáveis envolvendo partes não relacionadas/independentes. Ou seja, a ideia é que seja possível chegar ao valor da operação caso ela fosse praticada por empresas não ligadas.

Nesse sentido, a MP também lista situações que são consideradas como operações entre partes relacionadas, tais quais: operações entre controlador e controlada, entidades que tenham sócios em comum e que tenham controle em comum, dentre outras

1.1 Adoção dos métodos

A MP prevê cinco métodos, repaginados e já conhecidos na prática internacional, a serem seguidos pelos contribuintes para definição da base de cálculo do IRPJ e CSLL, são eles:

  • Preço Independente Comparável (PIC);
  • Preço de Revenda menos Lucro (PRL);
  • Custo mais Lucro (MCL);
  • Margem Líquida da Transação (MLT);
  • Divisão do Lucro (MDL).

    Além disso, admite-se a adoção de outros métodos, desde que a metodologia alternativa adotada produza resultado consistente com aquele que seria alcançado em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas.

    O principal ponto observado é que, ao contrário do sistema atual, não há total liberdade do contribuinte para escolha dos métodos, ou seja, o contribuinte não poderá optar pelo método que lhe é mais benéfico, e sim deverá optar pelo método que reflita, de forma mais apropriada, o valor da operação caso ela fosse realizada entre partes não relacionadas/independentes, em outras palavras, passa-se a adotar o chamado método “mais apropriado”.

2. Commodities

A MP prevê uma sistemática específica para operações envolvendo commodities. Para esses casos, quando houver informações confiáveis de preços independentes comparáveis para a commodity transacionada, o contribuinte deverá utilizar o método PIC-Preço Independente Comparável, com a extinção dos métodos PCI e PECEX.

3. Intangíveis

A MP inova também em dispor sobre uma abordagem específica às transações que envolvam intangíveis, intangíveis de difícil valoração, contratos de compartilhamento de custos, serviços intragrupo, reestruturação de negócios e operações financeiras. Ademais, assim como as commodities, foram incluídos como intangíveis: os royalties, a propriedade intelectual e as patentes, dentre outros.

Em relação a essas transações, saliente-se que a MP aborda diversas considerações que, junto dos métodos previstos, devem permitir maior clareza sobre a natureza dos ajustes a serem feitos, de forma a ampliar a segurança jurídica e facilitar o processo de consulta, bem como de solução de conflitos entre fisco e contribuintes.

4. Transações Controladas

As novas regras trazidas pela MP são aplicáveis a qualquer relação comercial ou financeira entre duas ou mais partes relacionadas, realizada de forma direta ou indireta, incluídos contratos ou arranjos sob qualquer forma e série de transações.

5. Ampliação do conceito de partes relacionadas

Enquanto a legislação anterior previa um rol taxativo de “pessoas vinculadas”, a referida MP adota o critério da “influência” para definição das partes sujeitas às regras de preços de transferência. Nos termos de seu art. 4º, tal circunstância se verificará quando uma das partes estiver sujeita à influência, exercida direta ou indiretamente por outra parte, “que possa levar ao estabelecimento de termos e condições em suas transações que divirjam daqueles que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em transações comparáveis”. E, apesar do conceito ampliado de partes relacionadas do caput do aludido artigo, o §1º dispõe sobre as hipóteses de presunção absoluta de influência que figuravam no rol da legislação anterior, como por exemplo, entidades incluídas nas demonstrações financeiras consolidadas e a entidade e a pessoa natual que for cônjuge, companheiro o parente, consanguíneo ou afim até 3º grau de Conselheiro, Diretor ou Controlador.

6. Penalidades

A MP prevê que os contribuintes apresentem, sob pena de multa, todas as informações e as documentações que ampararam o cálculo do IRPJ e da CSLL. Nesse sentido, o próprio art. 8º da MP prevê que, caso o fisco federal identifique que partes não relacionadas não teriam realizado a transação de acordo com o que foi apontado pelo contribuinte, a operação poderá ser desconsiderada pela fiscalização. Outrossim, de acordo com a Receita Federal, ainda deverá ser editado ato com o detalhamento para o novo conjunto de obrigações acessórias.

7. Consultas específicas prévias à Receita Federal

Uma das grandes novidades trazidas pela MP é a possibilidade de o contribuinte realizar consultas específicas em matéria de preços de transferência junto à Receita Federal objetivando alinhar previamente pontos relacionados a operações que estiverem sujeitas às novas regras. Para esses casos, entretanto, será necessário o pagamento de uma taxa de R$ 80 mil. No mais, cumpre salientar que a consulta terá validade de quatro anos, sendo que para a extensão de sua vigência se fará necessário o pagamento de mais R$ 20 mil.

Segundo especialistas da área, a possibilidade de um diálogo entre fisco federal e contribuinte é um ponto muito positivo da MP, pois, além de possibilitar que os contribuintes possam alinhar pontos relacionados ao preço de transferência antes da realização da operação, pode ser uma medida importante para evitar uma infinidade de autuações fiscais que porventura venham a surgir ante as novas regras.

8. Eficácia e Vigência

A título de eficácia, a MP passa a ter vigência com sua publicação, porém produzindo seus efeitos de forma facultativa a partir de 1º de janeiro de 2023, a qual converge para o padrão OCDE, tão somente aos contribuintes que optarem pela opção de aplicação das novas regras, nos termos do respectivo art. 46, o qual dispõe: O contribuinte poderá optar pela aplicação do disposto nos art. 1º a art. 45 desta Medida Provisória para o ano-calendário de 2023.” Para todos os demais, os efeitos se darão obrigatoriamente a partir de 1º de janeiro de 2024.

Saliente-se ainda que, por tratar-se de Medida Provisória, a MP 1.152/22 precisa passar pelo Congresso Nacional nos próximos meses para ser convertida em lei e ter seus efeitos confirmados. Entretanto, por envolver IR, mesmo que a MP seja convertida em lei em 2023, as novas regras só valerão a partir de 2024 em razão do princípio da anualidade. Ademais, conforme ainda esclarece a advogada da Vendemmia, Tatiana S. Cavalcante, as disposições da MP ainda exigirão regulamentação por parte da Receita Federal para a sua correta aplicação.

Por fim cumpre frisar, segundo a própria Receita Federal, que referida alteração “permitirá uma maior integração da economia brasileira ao mercado internacional, eliminando barreiras que dificultam o comércio, a competitividade entre as empresas, o desenvolvimento de novas tecnologias no País, a atração de investimentos e, consequentemente, a geração de emprego e o desenvolvimento nacional. O novo regramento elimina, ainda, lacunas hoje existentes no sistema que permitem que a base tributária brasileira seja erodida e oferecem espaços para a utilização de abordagens deletérias para a arrecadação das receitas necessárias para suportar os gastos sociais”.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2022/Mpv/mpv1152.htm

Para essas e outras questões atinentes ao tema e ao cenário atual do Comércio Exterior, bem como, interpretativas e de estrutura legal, a equipe Vendemmia está pronta para lhe auxiliar em seus desafios.

Disto, seguiremos acompanhando todos os desdobramentos.

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